Presidente do HL7 Brasil explica interoperabilidade em podcast

A presidente do HL7 Brasil, Jussara Macedo Rötzsch, concedeu entrevista ao FOLKScast, que está promovendo uma série sobre informática clinica. Na conversa com Leandro Miranda, médico e líder de prática de informática clínica na FOLKS, Jussara explicou o que é interoperabilidade, qual é a sua importância e falou de quais são os desafios e oportunidades para o seu avanço no Brasil.

Jussara, que é psiquiatra, explicou como a interoperabilidade entrou em sua vida.

“A interoperabilidade surgiu na minha vida justamente por conta do problema de comunicação entre os profissionais de saúde e a dificuldade que a gente tinha de acessar os dados dos pacientes em outros sistemas. Eu trabalhei muitos anos na emergência psiquiátrica, quem trabalha em qualquer tipo de emergência sabe como é receber um paciente e não saber o histórico dele. Você muitas vezes pode receber um paciente com um histórico clínico, ele pode estar tendo um problema clínico com manifestações psiquiátricas e você não sabe se vai interná-lo como psicótico, ou se você tem que encaminhar esse paciente para emergência clínica. Então eu me preocupo com isso há muitos anos, e foi assim que surgiu a informática de saúde na minha vida, com a minha necessidade de me comunicar com os colegas, com a enfermagem e com outros serviços”, afirmou.

Interoperabilidade x integração

A presidente do HL7 Brasil explicou por que a interoperabilidade vai além da simples integração.

“A interoperabilidade não é só uma questão de integração de sistemas, é um problema humano, um problema da clínica. Porque a gente usa muitos vocabulários diferentes, nossos sistemas são diferentes, então às vezes fica muito difícil você se comunicar com outro colega. Na integração os sistemas continuam sendo iguais ao que eles eram e tem mecanismos chamados de de/para para trazer informação de um sistema para outro. Quando eu faço isso com integração eu sempre perco informação, porque se eu não entender a informação, eu posso duplicar aquela informação, eu posso ignorar aquela informação. Nos sistemas integrados eu consigo de alguma forma capturar informação de outro sistema, mas eu não tenho capacidade de pegar aquela informação e processá-la sem decodificar, fazer uma tradução, e como toda tradução ela é imperfeita. Na interoperabilidade, ela tem vários níveis, a sintática, a semântica”, explicou.

Desafios para a implantação

Em seguida, ela falou sobre o longo histórico do HL7 Brasil ao longo das últimas duas décadas para implantar a interoperabilidade no Brasil. Jussara também falou sobre os principais desafios para a implantação da interoperabilidade total na saúde brasileira.

“Falta de conhecimento, custo, resistência à mudança, e a questão que une tudo isso, do sistema ligado, que fazem muito lobby para que não tenha isso. E aqui no Brasil a gente tem um grau de maturidade digital que a interoperabilidade só vai existir mesmo quando nós clínicos tomarmos a direção para que os sistemas possam ser feitos para apoio à nossa atividade”, disse.

Limites da inteligência artificial

A doutora analisou como a inteligência artificial pode ajudar na adoção da interoperabilidade, mas ressalvou que há muita coisa que ainda depende exclusivamente da atuação humana.

“A inteligência artificial não raciocina, ela é um Google que fala, um Google turbinado e que fala. Mas eles são papagaios ainda. No munodo da saúde uma dificuldade que eles têm é trabalhar no universo fechado que é o sistema de informação. Se eles não tiverem contexto… Hoje existe a IA semântica, que usa os padrões, o FIHR, o Openehr, para aumentar a acurácia, e aumentam sim, sensivelmente. Sem os padrões ela está perdida, porque não vai encontrar. Mas com os padrões aumenta muito a acurácia. Permite que você classifique as informações melhor, dê sentido a essas informações, classifique tudo, e aí sim você consegue colocar uma inteligência artificial para trabalhar nesse universo”, exemplificou.

Janela de oportunidade aberta pela pandemia

Ela concluiu a entrevista com uma análise otimista do cenário atual, no qual a pandemia abriu uma janela de oportunidade inédita para a implantação da interoperabilidade.

“Depois da pandemia a gente fez um salto quântico. Até a pandemia a gente usava telemedicina, mas não tinha essa necessidade toda. E quando ficou trancado em casa a gente viu que precisava. Hoje no Brasil a gente já tem uma rede nacional da saúde, a gente está fazendo coisas com o International Patient Summary que já traz bastante progressos ao Brasil em termos de adoção de padrão, coisa que a gente já tinha. Hoje a gente já tem muito interesse do mercado, estamos num momento de avanço. A gente está organizando uma frente ampla com as organizações, com a ABCIS, com a SBIS, com o HL7, com a Abramed, eu nunca vi tanto interesse dessas instituições em implementar a interoperabilidade. A gente está no momento mais feliz e não deve voltar atrás”, afirmou.

O podcast já está disponível na íntegra e pode ser ouvido no Spotify.